Fonte: Estadão - Opinião - Colunas - 05/07/2025 

adib jatene

Lutou por suas ideias tratando de doentes, lecionando, organizando instituições, formando equipes e exercendo cargos públicos

No dia 4 de junho, o saudoso dr. Adib Jatene completaria 96 anos de vida. Nasceu em Xapuri, no Estado do Acre, e faleceu em São Paulo no dia 14 de novembro de 2014.

Foi professor, acadêmico, médico e inventor na área médica. Graduou-se na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e recebeu o título de professor emérito.

Fui seu amigo e paciente e não tenho dúvida em afirmar que ele foi um médico altamente qualificado, inovador e articulado, educador, formador de equipes e líder inconteste na área médica. Adquiriu renome internacional graças às suas contribuições originais em cirurgia cardíaca, especialmente a cirurgia para a transposição de grandes artérias e a correção de aneurismas ventriculares. Foi um dos principais organizadores do Instituto Dante Pazzanese.

Foi professor emérito da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e do Instituto do Coração (Incor). Exerceu os cargos de secretário de Saúde do Estado de São Paulo e ministro da Saúde do Brasil.

Tive o privilégio de entrevistá-lo inúmeras vezes em meu antigo programa de TV – Diálogo Nacional. Aprendi muito nas conversas em que ele analisava com profundidade o papel da Universidade brasileira e os problemas enfrentados pelo ensino médico. Analisava com rara precisão as pressões para a criação de novas escolas médicas e, principalmente, a falta de estruturas adequadas para o oferecimento de condições ao ensino médico qualificado.

Considerava a Universidade como um centro gerador. Defendia o conceito de que a liderança acadêmica é a liderança do mérito da inteligência e da produtividade. Discutia com conhecimento de causa o papel do hospital universitário.

Em nossas conversas, Adib dizia que o País é nosso, e não do governo, enfatizando o direito e o dever dos cidadãos de participar da condução do seu destino. Sustentava que o Brasil precisava manter seus centros de excelência para o ensino, pesquisa e desenvolvimento tecnológico, bem como para a assistência médica mínima para todos, sob pena de cometer um erro humano de consequências desastrosas. Para isso, é preciso que toda a sociedade contribua.

Abordava o impacto das inovações tecnológicas sobre a prática médica, salientando os seus benefícios em termos diagnósticos e de tratamentos, chamando a atenção para a pressão da indústria de equipamentos farmacêuticos sobre os médicos.

Dr. Jatene discutia o modelo Incor de instituição, na qual uma parceria entre a universidade estadual, o próprio governo do Estado e uma fundação particular – Fundação Zerbini –, permitiria que se criasse uma instituição de alta competência assistencial e de grande produção científica.

Quando foi secretário de Saúde do Estado, Adib costumava dizer que toda reivindicação, quando legítima, deve ser aceita por todos. O grande problema é legitimar a reivindicação. O processo de legitimação deve alinhar argumentos que não só justifiquem eventuais movimentos, mas também demonstrem que, no processo, não se atinjam direitos de outrem.

Oficialmente aposentado da universidade, continuou trabalhando pelo seu aperfeiçoamento e pela medicina em geral. Lutou por suas ideias tratando de doentes, lecionando, organizando instituições, formando equipes e exercendo cargos públicos.

Foi um excelente engenheiro, criando peças de relevância para a cirurgia cardíaca.

Tive o privilégio de ser seu amigo e paciente. Fui operado pelo mestre, que implantou duas pontes em meu coração graças à qual sobrevivo em ótimas condições.

Sou testemunha de suas lutas, ideais, conquistas e méritos.

Teve uma família exemplar: foi casado, foi pai de quatro filhos e teve 10 netos.

Conforme ele dizia, a família deu-lhe força para enfrentar os desafios e tolerar as frustrações com ânimo e entusiasmo.

A Editora Atheneu publicou o livro Adib D. Jatene – Medicina, Saúde e Sociedade, prefaciado pelo professor Protásio L. da Luz.

Saudades do amigo e mestre Adib Jatene.

Opinião por Ruy Martins Altenfelder Silva - Advogado, presidente Emérito da Academia Paulista de Letras Jurídicas